I ESTAÇÃO
Jesus condenado à morte
Do Evangelho segundo João 18, 38b-40
Dito isto, [Pilatos] foi ter de novo com os judeus e disse-lhes: «Não vejo n’Ele nenhum crime. Mas é costume eu libertar-vos um preso na Páscoa. Quereis que vos solte o rei dos judeus?» Eles puseram-se de novo a gritar, dizendo: «Esse não, mas sim Barrabás!» Ora Barrabás era um salteador.
Pilatos não encontra particulares culpas que possa atribuir a Jesus, cede à pressão dos acusadores e, assim, o Nazareno é condenado à morte.
Temos a sensação de ouvir-Vos:
«Sim, fui condenado à morte;
muitas pessoas, que parecia que Me amavam
e compreendiam, deram ouvidos às mentiras
e acusaram-Me.
Não compreenderam o que Eu dizia.
Atraiçoado, sujeitaram-Me a julgamento e fui condenado.
À morte… Crucificado, a morte mais ignominiosa».
Não poucas das nossas famílias sofrem pela traição do cônjuge, a pessoa mais amada. Onde foi parar a alegria da intimidade, do viver em uníssono? Onde está o sentir-se um só? Onde está aquele «para sempre» com que se nos tinha declarado?
Fixar-Vos, Jesus, o Atraiçoado,
e viver convosco o momento em que desaba o amor
e a amizade que se tinham criado no nosso casal,
sentir no coração as feridas da confiança atraiçoada,
da familiaridade perdida, da segurança sumida.
Fixar-Vos, Jesus, precisamente agora
que sou julgado por quem não recorda o vínculo
que nos unia no dom total de nós mesmos.
Só Vós, Jesus, podeis compreender-me, podeis dar-me coragem,
podeis dizer-me palavras verdadeiras, embora me custe a entendê-las.
Podeis dar-me aquela força
que permita de, por minha vez, não julgar
de não sucumbir, por amor daquelas criaturas
que me esperam em casa
e para as quais agora sou o único amparo.
II ESTAÇÃO
Jesus é carregado com a Cruz.
Do Evangelho segundo João 19, 16-17
Então [Pilatos] entregou-O para ser crucificado. E eles tomaram conta de Jesus. Jesus, levando a cruz às costas, saiu para o chamado Lugar da Caveira, que em hebraico se diz Gólgota
.
Pilatos entrega Jesus nas mãos dos chefes dos sacerdotes e dos guardas. Os soldados colocam-Lhe aos ombros um manto escarlate e, na cabeça, uma coroa feita de ramos com espinhos; durante a noite zombam d’Ele, maltratam-No e flagelam-No. Em seguida, de manhã, carregam-No com um lenho pesado, a cruz onde são pregados os salteadores, para que todos vejam o destino que espera os malfeitores. Muitos dos seguidores d’Ele põem-se em fuga.
O sucedido há 2000 anos repete-se na história da Igreja e da humanidade. Hoje também. É o corpo de Cristo, é a Igreja que é atingida e ferida de novo.
Ao ver-Vos, Jesus, neste estado,
sangrando, sozinho, abandonado, escarnecido,
perguntamo-nos:
«Mas aquela gente que tanto tínheis amado,
beneficiado e iluminado,
aqueles homens, aquelas mulheres, não somos porventura também nós, hoje?
Também nós nos escondemos com medo de ser implicados,
esquecendo que somos os vossos seguidores».
Mas a coisa mais grave, Jesus,
é que também eu contribuí para o vosso sofrimento.
Também nós, esposos, e as nossas famílias.
Também nós contribuímos
para Vos carregar com um peso desumano.
Todas as vezes que não nos amámos,
quando demos a culpa um ao outro,
quando não nos perdoámos,
quando não recomeçámos a estimar-nos.
E nós, ao contrário,
continuamos a dar ouvidos à nossa soberba,
quisemos ter sempre razão, humilhámos quem vive junto de nós,
incluindo quem uniu a sua própria vida à nossa.
Deixamos de nos recordar que Vós mesmo, Jesus, nos dissestes:
«Tudo o que fizestes a um destes m
III ESTAÇÃO
Jesus cai pela primeira vez
Do Evangelho segundo Mateus 11, 28-30
«Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve».
Jesus cai. As feridas, o peso da cruz, a estrada a subir, em mau estado. E os empurrões da multidão. Mas não foi só isto que O reduziu a este estado. Talvez seja o peso da tragédia que tem início na sua vida. Já não se consegue ver Deus em Jesus, homem que Se mostra tão frágil, que tropeça e cai.
Jesus, lá, naquela estrada,
no meio de toda aquela gente que grita e murmura,
depois de terdes caído por terra,
levantais-Vos e procurais continuar a subida.
No fundo do coração sabeis que este sofrimento tem um sentido,
dais-Vos conta de ter carregado o peso
das nossas muitas faltas, traições e culpas.
Jesus, a vossa queda faz-nos sofrer
porque compreendemos que a causa somos nós;
ou talvez a nossa fragilidade,
não só física, mas de todo o nosso ser.
Quereríamos não cair jamais;
mas depois basta pouco, um obstáculo,
uma tentação ou um incidente,
deixamo-nos levar e caímos.
Prometêramos seguir Jesus, respeitar e cuidar das pessoas que Ele colocara ao nosso lado. Sim, na realidade, nós amamo-las ou pelo menos assim no-lo parece. Se viessem a faltar-nos, sofreríamos não pouco. Mas depois, nas situações concretas de cada dia, cedemos...
Quantas quedas nas nossas famílias!
Quantas separações, quantas traições!
E, depois, os divórcios, os abortos, os abandonos!
Jesus, ajudai-nos a compreender o que é o amor,
ensinai-nos a pedir perdão!
eus irmãos mais pequeninos,
a Mim o fizestes». Dissestes assim mesmo: «A Mim».
IV ESTAÇÃO
Jesus encontra sua Mãe
Do Evangelho segundo João 19, 25
Junto à cruz de Jesus estavam, de pé, sua mãe e a irmã da sua mãe, Maria, a mulher de Clopas, e Maria Madalena.
Na subida para o Calvário, Jesus entrevê sua mãe. Os seus olhares cruzam-se. Compreendem-se. Maria sabe quem é seu Filho. Sabe donde vem. Sabe qual é a sua missão. Maria sabe que é sua mãe; mas sabe também que é sua filha. Vê-O sofrer, por todos os homens... de ontem, de hoje e de amanhã. E sofre também Ela.
Certamente, Jesus,
sofreis por fazer sofrer assim a vossa mãe.
Mas deveis envolvê-La
na vossa divina e tremenda aventura.
É o plano de Deus,
para a salvação de toda a humanidade.
Para todos os homens e todas as mulheres deste mundo, mas de modo particular para nós, famílias, o encontro de Jesus com a mãe, lá no caminho do Calvário, é um acontecimento vivíssimo, sempre actual. Jesus privou-Se da mãe, para que nós – cada um de nós, incluindo nós esposos – tivéssemos uma mãe sempre disponível e presente. Às vezes, infelizmente, esquecemo-nos disso. Mas, quando reentramos em nós, damo-nos conta de que, na nossa vida de família, recorremos a Ela inúmeras vezes. Quanta assistência nos deu nos momentos difíceis! Quantas vezes Lhe recomendámos os nossos filhos, Lhe suplicámos que interviesse em favor da sua saúde física e, mais ainda, para ter uma protecção moral.
E quantas vezes Maria nos atendeu, sentimo-La perto de nós, confortando-nos com o seu amor materno.
Na
via-sacra de cada família, Maria é o modelo do silêncio que, mesmo na dor mais pungente, gera a vida nova.
V ESTAÇÃO
Jesus é ajudado por Simão Cireneu a levar a Cruz
Do Evangelho segundo Lucas 23, 26
Quando O iam conduzindo, lançaram mão de um certo Simão de Cirene, que voltava do campo, e carregaram-no com a cruz, para a levar atrás de Jesus.
Talvez Simão de Cirene nos represente a todos, quando inesperadamente nos sobrevém uma dificuldade, uma prova, uma doença, um peso imprevisto, uma cruz por vezes pesada. Porquê isto? Porquê precisamente a mim? Porquê neste momento? O Senhor chama-nos a segui-Lo, não sabemos onde nem como.
O melhor a fazer, Jesus,
é vir atrás de Vós, ser dóceis àquilo que nos pedis.
Muitas famílias podem-no confirmar
por experiência directa:
não serve rebelar-se, convém dizer-Vos sim,
porque Vós sois o Senhor do Céu e da Terra.
Mas não é só por isto
que podemos e queremos dizer-Vos sim.
Vós amais-nos com amor infinito.
Mais do que o pai, a mãe, os irmãos,
a esposa, o marido, os filhos.
Amais-nos com um amor que vê longe,
um amor que, para além de tudo,
mesmo da nossa miséria,
nos quer salvos, felizes, convosco, para sempre.
Também em família, nos momentos mais difíceis, quando se deve tomar uma decisão importante, se a paz habitar no coração, se se estiver atento para ver aquilo que Deus quer de nós, somos iluminados por uma luz que nos ajuda a discernir e a levar a nossa cruz.
O Cireneu recorda-nos ainda os inúmeros rostos de pessoas que se solidarizaram connosco nos momentos em que uma cruz pesada se abateu sobre nós ou sobre a nossa família. Faz-nos pensar em tantos voluntários que, em muitas partes do mundo, se dedicam generosamente a confortar e a ajudar quantos se encontram no sofrimento e na adversidade. Ensina-nos a deixarmo-nos humildemente ajudar, quando temos necessidade, e também a sermos cireneus para os o
VI ESTAÇÃO
A Verónica limpa o rosto de Jesus
Da Segunda Carta do apóstolo São Paulo aos Coríntios 4, 6
O Deus que disse: «Das trevas brilhe a luz», foi quem brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo.
A Verónica, uma das mulheres que segue Jesus, que intui quem Ele é, que O ama e por isso sofre ao vê-Lo sofrer. Agora entrevê de perto o seu rosto, aquele rosto que tantas vezes falara à sua alma. Vê-o turvado, ensanguentado e desfigurado, embora sempre manso e humilde.
Não resiste. Quer aliviar os seus sofrimentos. Pega num pano, e tenta enxugar sangue e suor daquele rosto.
Às vezes, na nossa vida, tivemos ocasião de enxugar lágrimas e suor das pessoas que sofrem. Talvez tenhamos assistido um doente terminal num corredor do hospital, ajudado um imigrante ou um desempregado, ouvido um encarcerado. E, procurando animá-lo, talvez tenhamos limpo o seu rosto, olhando-o com compaixão.
E todavia poucas vezes nos recordamos
de que, em cada irmão nosso que passa necessidade,
Vos escondeis Vós, Filho de Deus.
Como seria diversa a nossa vida
se nos recordássemos disso!
Pouco a pouco iremos tomando consciência da dignidade
de cada homem que vive sobre a terra.
Cada pessoa, linda ou feia, dotada ou não,
ainda nos primeiros momentos no ventre da mãe
ou então já idosa, sempre Vos representa, Jesus.
E não só... Cada irmão sois Vós.
Contemplando-Vos, reduzido a quase nada lá no Calvário,
compreenderemos com a Verónica
que em cada criatura humana pod
VII ESTAÇÃO
Jesus cai pela segunda vez
Da Primeira Carta do apóstolo São Pedro 2, 24
Subindo ao madeiro, Ele levou os nossos pecados no seu corpo, para que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça: pelas suas chagas fostes curados.
Pela segunda vez, enquanto avança pelo caminho estreito do Calvário, Jesus cai. Intuímos a sua fraqueza física, depois duma noite terrível, depois das torturas que Lhe infligiram. A fazê-Lo cair, talvez não sejam apenas as torturas, o exaurimento, o peso da cruz sobre os ombros. Sobre Jesus grava um peso não mensurável, algo de íntimo e profundo que, a cada passo, se vai fazendo sentir mais nitidamente.
Vemo-Vos como um pobre homem qualquer,
que errou na vida e agora tem de pagar.
E parece que não tendes mais força física ou moral
para enfrentar o novo dia... e caís.
Oh como nos reconhecemos em Vós, Jesus,
mesmo nesta nova queda por exaurimento!
Mas, eis que Vos levantais novamente; quereis conseguir...
Para nos dar, a todos nós,
a coragem de nos levantarmos de novo.
A nossa fraqueza existe,
mas o vosso amor é maior do que as nossas carências,
sempre pode acolher-nos e compreender-nos.
Os nossos pecados, cuja carga assumistes,
esmagam-Vos, mas a vossa misericórdia
é infinitamente maior do que as nossas misérias.
Sim, Jesus! Graças a Vós, levantamo-nos de novo.
Errámos.
Deixamo-nos levar pelas tentações do mundo,
quem sabe por incandescências de satisfação,
para ouvir dizer que alguém ainda nos deseja,
que alguém diz que nos quer bem, ou até que nos ama.
Às vezes sentimos dificuldade até para manter
o compromisso assumido da nossa fidelidade de esposos.
Já não temos o vigor e a decisão de outrora.
Tudo é repetitivo, cada acto parece pesado,
dá-nos vontade de fugir.
Mas procuramos levantar-nos, Jesus,
sem ceder à maior de todas as tentações:
a de não crer que o vosso amor pode tudo.
VIII ESTAÇÃO
Jesus encontra as mulheres de Jerusalém
que choram por Ele
Do Evangelho segundo Lucas 23, 27-28
Seguiam Jesus uma grande multidão de povo e umas mulheres que batiam no peito e se lamentavam por Ele. Jesus voltou-Se para elas e disse-lhes: «Filhas de Jerusalém, não choreis por Mim, chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos».
No meio da multidão que O segue, há um grupo de mulheres de Jerusalém: conhecem-No. Vendo-O naquelas condições, misturam-se com a multidão e sobem para o Calvário. Choram.
Jesus vê-as, entende o seu sentimento de compaixão. E, mesmo num momento trágico como aquele, quer deixar uma palavra que ultrapasse a simples compaixão. Deseja que nelas, que em nós não haja apenas comiseração mas conversão do coração: aquela que reconhece ter errado, que pede perdão, que recomeça uma vida nova.
Jesus, quantas vezes por cansaço ou por inconsciência,
por egoísmo ou por medo,
fechamos os olhos e não queremos enfrentar a realidade!
Sobretudo nós mesmos não nos envolvemos,
não nos comprometemos participando profunda e activamente
na vida e nas necessidades dos nossos irmãos, vizinhos e distantes.
Continuamos a viver comodamente,
deploramos o mal e quem o faz,
mas não mudamos a nossa vida
e não nos empenhamos pessoalmente para que as coisas mudem
e o mal seja debelado e triunfe a justiça.
Muitas vezes as situações não melhoram, porque não nos empenhámos em fazê-las mudar. Retiramo-nos sem fazer mal a ninguém, mas também sem fazer o bem que poderíamos e deveríamos fazer. E talvez alguém esteja a sofrer por isso, pela nossa evasão.
Jesus, que estas vossas palavras nos acordem,
nos dêem um pouco daquela força
que move as testemunhas do Evangelho,
muitas vezes também mártires, pais ou mães ou filhos,
que, com o seu sangue unido ao Vosso,
abriram e continuam a abrir também hoje
o caminho ao bem, no mu
IX ESTAÇÃO
Jesus cai pela terceira vez
Do Evangelho segundo Lucas 22, 28-30a
«Vós sois os que permaneceram sempre junto de Mim nas minhas provações, e Eu disponho do Reino a vosso favor, como meu Pai dispõe dele a meu favor, a fim de que comais e bebais à minha mesa, no meu Reino».
A subida da estrada é breve, mas a sua fraqueza é extrema. Jesus está esgotado não só fisicamente mas também no espírito. Sente sobre Si o ódio dos chefes, dos sacerdotes, da multidão; parecem querer descarregar sobre Ele a raiva reprimida pelas opressões passadas e presentes. Como se procurassem uma desforra, fazendo valer o seu poder sobre Jesus.
E caís… caís, Jesus, pela terceira vez.
Pareceis sucumbir.
Mas eis que, com um esforço extremo, Vos levantais
e retomais o caminho terrível para o Gólgota.
Certamente muitos irmãos nossos em todo o mundo
estão a sofrer provações tremendas porque Vos seguem, Jesus.
Estão a subir convosco para o Calvário
e convosco estão inclusive caindo
sob as perseguições que, desde há dois mil anos,
desferram sobre o vosso Corpo que é a Igreja.
Queremos, com estes nossos irmãos no coração, oferecer a nossa vida, as nossas fraquezas, a nossa miséria, os nossos pequenos e grandes sofrimentos diários. Muitas vezes vivemos anestesiados pelo bem-estar, sem nos comprometermos com todas as forças para nos levantarmos e levantar a humanidade. Mas podemos erguer-nos, porque Jesus encontrou a força de Se levantar e retomar o caminho.
Também as nossas famílias são parte deste tecido invertebrado, encontram-se ligadas a uma vida de bem-estar que se torna o objectivo da própria vida. Os nossos filhos crescem: procuramos habituá-los à sobriedade, ao sacrifício, à renúncia. Procuramos dar-lhes uma vida social satisfatória nos ambientes desportivos, associativos e recreativos, mas sem que estas actividades sejam apenas um modo de preencher o dia e ter tudo aquilo que se deseja.
Por isso, Jesus,
precisamos de escutar as vossas palavras,
que queremos testemunhar:
«Felizes os pobres, felizes os mansos, felizes os construtores de paz,
felizes aqueles que sofrem por amor da justiça…».
X ESTAÇÃO
Jesus é despojado das suas vestes
Do Evangelho segundo João 19, 23
Os soldados, depois (…) pegaram na roupa de Jesus e fizeram quatro partes, uma para cada soldado, excepto a túnica. A túnica, toda tecida de uma só peça de alto a baixo, não tinha costuras.
Jesus está nas mãos dos soldados. Como todo o condenado, é despojado das vestes, para O humilhar, reduzi-Lo a nada. A indiferença, o desprezo e a negligência pela dignidade da pessoa humana juntam-se com a avidez, a cobiça e os interesses privados: «Pegaram na roupa de Jesus».
A vossa túnica, Jesus, era sem costuras.
Isto exprime o cuidado que tinham por Vós
a vossa mãe e as pessoas que Vos seguiam.
Agora encontrais-Vos sem roupa, Jesus,
e sentis o incómodo de quem está à mercê de gente
que não tem respeito pela pessoa humana.
Quantas pessoas sofreram, e sofrem, por causa desta falta de respeito pela pessoa humana, pela sua intimidade. Às vezes talvez nós tenhamos também faltado ao respeito devido à dignidade pessoal de quem está ao nosso lado, «apoderando-nos» de quem nos está vizinho: filho ou marido ou esposa ou parente, conhecido ou desconhecido. Em nome da nossa suposta liberdade, ferimos a dos outros: quanta negligência, quanto descuido nos comportamentos e na maneira de nos apresentarmos um ao outro!
Jesus, que Se deixa expor deste modo aos olhos do mundo de então e aos olhos da humanidade de sempre, lembra-nos a grandeza da pessoa humana, a dignidade que Deus concedeu a cada homem, a cada mulher e que nada e ninguém deveria violar, porque são plasmados à imagem de Deus. A nós está confiada a tarefa de promover o respeito da pessoa humana e do seu corpo. Em particular a nós, esposos, cabe a tarefa de conjugar estas duas realidades fundamentais e indivisíveis: a dignidade e o dom total de si mesmo.
XI ESTAÇÃO
Jesus é pregado na Cruz
Do Evangelho segundo João19, 18-19
Lá O crucificaram, e com Ele outros dois, um de cada lado, ficando Jesus no meio. Pilatos redigiu um letreiro e mandou pô-lo sobre a cruz. Dizia: «Jesus Nazareno, Rei dos Judeus».
Chegados ao lugar chamado «Calvário», os soldados crucificam Jesus. Pilatos manda escrever: «Jesus Nazareno, Rei dos Judeus», para zombar d’Ele e humilhar os judeus. Mas esta inscrição, embora sem o pretender, atesta uma realidade: a realeza de Jesus, Rei de um Reino que não tem fronteiras de espaço nem de tempo.
Mal podemos imaginar o sofrimento de Jesus durante a crucifixão, cruenta e dolorosíssima. Entra-se no mistério: Porque é que Deus, que Se fez homem por nosso amor, Se deixa pregar num madeiro e erguer da terra entre atrozes espasmos físicos e espirituais?
Por amor. Por amor. É a lei do amor que leva a dar a própria vida pelo bem do outro. Confirmam-no aquelas mães que aguentaram a própria morte para dar à luz o seu filho. Ou aqueles pais que perderam um filho na guerra ou em actos de terrorismo, e decidem não se vingar.
Jesus, no Calvário, personificais a todos nós,
todos os homens de ontem, hoje e amanhã.
Na cruz, ensinastes-nos a amar.
Agora começamos a compreender o segredo daquela alegria perfeita
que proclamáveis aos discípulos na Última Ceia.
Tivestes de descer do Céu, fazer-Vos menino,
depois adulto e por fim sofrer no Calvário
para nos dizer, com a vossa vida, o que é o verdadeiro amor.
Contemplando-Vos lá no alto da cruz, também nós enquanto família, esposos, pais e filhos, estamos a aprender a amar-nos e a amar, a revigorar entre nós aquele acolhimento que é dar-se a si mesmo e saber-se acolhido com gratidão; que sabe sofrer, que sabe transformar o sofrimento em amor.
XII ESTAÇÃO
Jesus morre na Cruz
Do Evangelho segundo Mateus 27, 45-46
Desde o meio-dia até às três horas da tarde, as trevas envolveram toda a terra. Cerca das três hora da tarde, Jesus clamou com voz forte: Eli, Eli, lemá sabactháni?
, isto é: Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?».
Jesus está na cruz. Horas de angústia, horas terríveis, horas de dores físicas desumanas. «Tenho sede»: diz Jesus. E levam-Lhe à boca uma esponja ensopada em vinagre.
Um grito ergue-se inesperado: «Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?». Blasfémia? O condenado grita o Salmo? Como aceitar um Deus que grita, que Se lamenta, que não sabe, não compreende? O Filho de Deus feito homem que Se sente morrer abandonado por seu Pai?
Jesus, até este ponto Vos fizestes um de nós,
um connosco, à excepção do pecado!
Vós, Filho de Deus feito homem,
identificastes-Vos connosco até ao ponto de experimentar,
Vós que sois o Santo, a nossa condição de pecadores,
a separação de Deus, o inferno daqueles que estão sem Deus.
Vós experimentastes a escuridão para nos dar a luz.
Vivestes a separação para nos dar a unidade.
Aceitastes a dor para nos deixar o Amor.
Provastes a exclusão, abandonado e suspenso
entre Céu e Terra, para nos acolher na vida de Deus.
Um mistério nos envolve
revivendo cada passo da vossa Paixão.
Jesus, não considerais ciosamente como um tesouro
a vossa igualdade com Deus,
mas fazeis-Vos pobre de tudo para nos enriquecer.
«Nas vossas mãos, entrego o meu espírito».
Como conseguistes, Jesus, naquele abismo de desolação,
confiar-Vos ao Amor do Pai,
abandonar-Vos a Ele, morrer n’Ele?
Somente olhando para Vós, somente convosco
podemos enfrentar as tragédias, os sofrimentos dos inocentes,
as humilhações, os ultrajes, a morte.
Jesus vive a sua morte como dom por mim, por nós, pela nossa família, por cada pessoa, por cada família, por cada povo, pela humanid
XIII ESTAÇÃO
Jesus é descido da Cruz
e entregue a sua Mãe
Do Evangelho segundo João19, 38
Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus, mas secretamente por medo das autoridades judaicas, pediu a Pilatos que lhe deixasse levar o corpo de Jesus. E Pilatos permitiu-lho. Veio, pois, e retirou o corpo.
Maria vê morrer seu Filho, Filho de Deus e também d’Ela. Sabe que é inocente, mas carregou sobre Si o peso das nossas misérias. A Mãe oferece o Filho, o Filho oferece a Mãe. A João, a nós.
Jesus e Maria, eis um família que, no Calvário, vive e sofre a separação suprema. A morte divide-os, ou pelo menos parece dividi-los, uma mãe e um filho com um vínculo simultaneamente humano e divino inconcebível. Por amor, o oferecem. Abandonam-se ambos à Vontade de Deus.
Na voragem que se abriu no coração de Maria, entra outro filho, que representa a humanidade inteira. E o amor de Maria por cada um de nós é o prolongamento do amor que Ela teve por Jesus. Sim, porque, nos discípulos, verá o rosto d’Ele. E viverá para eles, para sustentá-los, ajudá-los, encorajá-los, levá-los a reconhecer o Amor de Deus, para que, na sua liberdade, se voltem para o Pai.
Que dizem a mim, a nós, à nossa família esta Mãe e este Filho no Calvário? Cada um pode apenas deter-se, atónito, diante de tal cena. Intui que esta Mãe, este Filho nos estão a conceder um dom único, irrepetível. De facto, n’Eles, encontramos a capacidade de dilatar o nosso coração e abrir o nosso horizonte à dimensão universal.
Lá, no Calvário,
junto de Vós, Jesus, morto por nós,
as nossas famílias acolhem o dom de Deus:
o dom de um amor
que pode alargar os braços até ao infinito.
XIV ESTAÇÃO
Jesus é depositado no sepulcro
Do Evangelho segundo João 19, 41-42
No sítio em que Ele tinha sido crucificado havia um jardim e, no jardim, um túmulo novo, onde ainda ninguém tinha sido sepultado. Como para os judeus era o dia da Preparação da Páscoa e o túmulo estava perto, foi ali que puseram Jesus.
Um profundo silêncio envolve o Calvário. No seu Evangelho, João atesta que o Calvário se encontra num jardim, onde existe um sepulcro ainda não usado. E é lá precisamente que os discípulos depõem o seu corpo.
Aquele Jesus, que aos poucos reconheceram como Deus que Se fez homem, está lá, cadáver. Na solidão desconhecida, sentem-se perdidos, não sabem que fazer, nem como comportar-se. Nada mais lhes resta que consolar-se reciprocamente, encorajar-se um ao outro, permanecer juntos. Mas é precisamente então que matura nos discípulos o momento da fé, da recordação daquilo que Jesus disse e fez quando estava no meio deles, e que antes só em parte tinham compreendido.
Lá começam a ser Igreja, à espera da Ressurreição e da efusão do Espírito. Com eles, está a mãe de Jesus, Maria, que o Filho entregara a João. Reúnem-se todos com Ela, à volta d’Ela. À espera. À espera que o Senhor Se manifeste.
Sabemos que aquele corpo, três dias depois, ressuscitou. Assim Jesus vive para sempre e nos acompanha, Ele pessoalmente, ao longo da nossa viagem terrena, entre alegrias e tribulações.
Jesus, fazei que nos amemos mutuamente.
Para Vos termos de novo no meio de nós,
cada dia, como Vós mesmo prometestes:
«Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome,
Eu estou no meio deles».